Nome do programa
“Olá, meu nome é João e seja muito bem-vindo ao... Programa do João! Pegue uma cadeira e aproveite essa noite maravilhosa! E vamos lá para o nosso primeiro quadro: Responde aí, João! Primeira pergunta: João, por que seu nome é João? Nossa, essa é profunda, vai lá no fundo do âmago da pessoa, sabe... Deixa eu pensar...”
- Vou te contar a real, cara...
- Péra, pode parar por aí! Não quero ter que testemunhar depois.
Acabou a sua carreira de espião. Capa de um documentário sobre a profissão, era reconhecido em todas as missões.
- E lá vem o Super Funcionário do Mês! Ele é rápido, chega na hora, é prestativo, pergunta para os colegas se eles querem café, é amigável, paga uma rodada toda vez no happy hour, mas acima de tudo: ele digita com os 10 dedos! Ele é incrível!
- Ver um filme com companhia é sempre melhor do que sozinho.
- Humm... Mesmo com pessoas que ficam falando o filme todo?
- Mesmo com essas pessoas - disse sorrindo.
Após meses de dieta, quilos perdidos, saúde conquistada, comeu a primeira barra de chocolate. Ao invés de sentir prazer, sentiu culpa.
- Eu queria te dizer uma coisa.
- Diz.
- Ah, mas eu não sei se eu digo.
- Então não diz.
- Você não está ajudando...
O cozinheiro de porcelana sorria abertamente na prateleira, feliz, com seu chapéu branco, pronto para o próximo prato da semana.
Olhou para o nada, refletindo sobre a vida. Até que alguém estalou os dedos. Acordou.
- Ei, você!
- Eu?
- É, você mesmo!
- O que foi?
- Ah, nada não... Deixa pra lá.
- Mas então, me conta, qual a história, o que faz, suas pretensões, seus amores, pesares, dúvidas, angústias... Qual é o seu sonho?
- Meu sonho... Vou te falar qual é o meu sonho. Meu sonho é tomar esse café em paz. Depois um remédio para dor de cabeça, deitar e dormir. Tá bom pra você?
Entrou no salão e já sabia que em poucos minutos garrafas voariam, balas também, assim como socos, pontapés e sangue.
Estava no oeste selvagem, afinal.
Início de noite de domingo. Sofá, jogo na tevê, calça de preguiça, blusa, casa quentinha, narração na tela e comentários do pai ao lado. O que mais pedir? Apenas agradecer.
As palavras vem e vão, de tempos em tempo, até que param de vir e só sobra o silêncio, apenas o silêncio. Mas sempre dá pra cantar uma música, ligar o rádio, ou falar sozinho.
- Opa, tudo bem, como é que vai, tudo certo, como vai essa firmeza, beleza?
Sempre disparava vários ois ao chegar nos lugares, sem nunca dizer oi.
No alto daquela colina, um vaqueiro com coldre completo, estava sempre atento ao que acontecia na cidadezinha.
Disse adeus a tudo que não queria, caindo na armadilha que ele mesmo plantou. Adeus em vão.
As gritarias na casa do vizinho o assustou. Não sabia o que deveria fazer.
Então parou.
É sobre pensar na caveira com a vela acesa derretendo.
Ela vai se apagar.
Não vou ser piegas, o tempo passa. Sempre volto ao tempo.
E é ele que manda em todas as coisas. Você vai continuar ou não.
Fazer aquilo que é importante para você? Bobagem? E se
você parasse? O que aconteceria?
Será que vale a pena?
Filosofia barata, é o que tenho para hoje. E aquela
ideia? Aquela língua nova? Aquele convite para tomar um café que se
transformaria em um orgasmo e num coração partido depois?
Tudo cíclico. Tudo vai, volta, às vezes não volta.
Mas o que eu quero dizer com isso tudo? Uso a escrita
quando estou num farol vermelho? Quando estou apaixonado? Quando estou pedindo
meia dúzia de pãezinhos na padaria do mercado? Quando digo “vamo deixar pra
outro dia”? Uso a escrita quando alguém me lê? Se alguém me ler.
Está tudo muito confuso. Não sei qual a resposta.
Café Aquarelado #03
Conto de Lucas Beça
