Era um dia para se lembrar. Seu aniversário.
Fazia tantos anos. Não queria se lembrar da quantidade. Não
queria festa. Bolo. Nada.
Levantou-se da cama e nada havia mudado.
Os mesmos quilos a mais. A mesma cara por barbear. Os mesmos
olhos cansados.
A mesma camisa esfarrapada.
Foi trabalhar. Trabalhou.
Na hora do almoço sentou-se numa mesa sozinho. Uma mulher se
aproximou.
- Posso sentar aqui? As outras mesas tão ocupadas.
Tudo bem, ele disse, sem se preocupar muito.
Viu seu reflexo num espelho na parede.
Parou de comer. Levantou as sobrancelhas.
Tocava alguma música hipster com violão no fundo.
Os lances da rodada do fim de semana na TV.
Sua camisa estava virada do avesso.
A moça que estava comendo em sua mesa o olhou com um sorriso
abobalhado.
- Rá, tá do avesso.
Ele a olhou espantado.
Acontece, ela disse.
Ficou triste, não embaraçado. Deixou transparecer.
Levantou-se e foi ao banheiro.
A moça continuou comendo.
Estava ocupado. Ele encostou-se na parede. Viu-a de costas.
Até que era bonita, pensou. O cabelo não ajuda muito.
A porta abriu.
Entrou.
Tirou a camisa. Desvirou-a. Jogou água sobre o rosto.
Olhou-se fixamente.
Jogou água no espelho.
Vestiu a camisa e saiu.
Seu prato estava limpo.
Viu a moça atravessando a porta.
Ela fez uma careta ao passar.
Pensou em ir atrás dela para que pagasse o almoço que ela
comeu. Mas estava cansado.
Sentou-se à mesa e tomou o copo Coca-Cola que ainda restava.
No guardanapo havia um batom no formato de um beijo e um
RáRá! escrito em caneta azul.
Pagou a conta.
Voltou ao trabalho.
Ninguém ligou para desejar feliz aniversário, fora sua mãe e
sua tia.
Ele não tinha perfil no Facebook.
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